Pelo direito à expressão da tristeza.

Publicado em 10 de junho de 2013.

Em tempos digitais vivemos a exacerbação de algumas ditaduras antigas: a da beleza, do sucesso e ultimamente uma ainda mais perigosa, a da felicidade. Basta olhar as redes sociais e ver o que se posta e os comentários para entender do que estou falando: viagens, eventos sociais, crianças brincando e família reunida. Os comentários: “Lindos, linda, casal perfeito, etc, etc.”. Nada de errado até aí. O único problema, é que inconscientemente apenas permitimos espaço para mostrar os movimentos de sucesso em nossas vidas. Ninguém fala das dificuldades, das incertezas, das perdas, claro não pegaria nada bem. Mas a verdade é que TODOS temos muitos problemas. Na internet e especialmente nas redes sociais devemos ser lindos, politicamente corretos, bem-sucedidos e mostrar fotos de viagens incríveis, lugares inusitados e famílias unidas e em crescimento.

E então eu me pergunto se neste universo do belo, feliz e realizado, existiria ainda algum lugar para reservamos momentos de introspecção, de contemplação e eventualmente, porque não, de tristeza?  Nos vemos cada vez mais impelidos não apenas a consumir, mas a exposição do consumo e do sucesso associado a ele agora ultrapassa os limites da vizinhança e alcança proporções globais. Uma pessoa do outro lado do mundo, que sequer conhecemos, já pode ver a nossa nova casa, novo carro, roupa ou apenas uma foto nossa na praia, numa festa, coisas de fazer inveja.

Com a ditadura do “perfeito” invadindo nossas próprias mentes será que não estamos construindo nossa própria prisão? Sem querer, podemos ficar escravos de um mundo ilusório, no qual tudo é, para todos os efeitos, perfeito… Será que essa busca exteriorizada por uma “vida de conto de fadas” não nos está levando cada vez mais a procurar alívio em remédios, drogas, experiências diversas e a testar nossos próprios limites?

No final, o resultado de supressão desses estados pode ser ainda pior, o embotamento ou a depressão. Estes podem aparecer como fruto de nossa incapacidade de lidar com esse mundo artificial, que exige de nós o retrato da alegria e plenitude. É óbvio que isso é impossível em qualquer esfera, mesmo para os artistas de Hollywood. O que dirá de nós, pobres mortais. Mas é claro também que nos vemos incapazes de nadar contra a corrente e gritar em alto e bom som que tudo isso não passa de uma farsa, e de que na verdade, somos apenas humanos.

Porque será então que as filosofias orientais são claras em proclamar a busca por um estado de equilíbrio? Porque se existe euforia, existe depressão, se existe alegria, existe a tristeza e por aí vai. Esses “opostos” longe de se atraírem, apenas coexistem em diferentes e sucessivos momentos de nossas vidas.

Mas então quando devemos buscar ajuda profissional? Quando existe um embotamento, uma vontade persistente de não fazer nada, sono demais, uma tristeza profunda e sem razão, que não tenha sido causada por em evento importante como a perda de alguém querido, doença grave, etc. Um sinal importante é quando há um desinteresse geral e um vazio, ou ausência de sentido naquilo que fazemos. Mas antes que isso aconteça, reveja seus valores, suas expectativas e a forma como tem construído sua vida. Muitas vezes a causa de nosso sofrimento está escondida sob a construção de ideais imaginários, difíceis ou impossíveis de serem conquistados ou mantidos. Infelizmente as revistas e os programas de TV aos quais estamos expostos só ajudam a exacerbar essa sensação de descompasso.

Exercite-se sempre, reeduque sua respiração e mude seus hábitos e ache um espaço para sua própria expressão. Reserve sempre um tempo para ficar com você mesmo e com a natureza. E então, comece a olhar para seus ideais de forma neutra. verificando se eles não estão um pouco irreais. Somos seres falíveis, incompletos, mutáveis, cheios de imperfeições e dúvidas. Por vezes, ainda, inundados pelo medo. Negar esses aspectos, é assinar uma promissória com a frustração. A saída para uma vida mais equilibrada está em reconhecer esses estados sem tentar mudá-los. Afinal, como tudo na natureza, eles também são transitórios…E por mais que possa parecer o contrário, nós também somos partes dessa natureza. Por isso, dar espaço para o aparecimento e reconhecimento dessas emoções sem julgamento, pode ser o primeiro passo para poder transcendê-las. As diversas formas de arte, estão aí exatamente para isso, pura expressão.

 


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